Dezesseis, A Estrada da Morte (Part 2) – Simone Pesci
Part 2 da amostra ..
podem babar eu deixo ..
Copyright ©2015 – Todos os direitos reservados
Produção Editorial: Simone Pesci
Capa: Décio Gomes
Diagramação: Gisele G. Garcia
Revisão: Angie Stanley
Editora: Tribo das Letras
ISBN: 978-85-5560-010-4
Nenhuma parte deste livro poderá ser reproduzida, transmitida e
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sem a prévia autorização, por escrito, da Autora.
2
MAIS UM DIA
MAIS UM DIA
“Às vezes nem me preocupo tanto
comigo...
Mas há pessoas que amo e não quero vê-las sofrer.”
(Renato Russo)
Mas há pessoas que amo e não quero vê-las sofrer.”
(Renato Russo)
Ela estava sobre o meu corpo, trajando uma velha e
surrada camiseta minha, com os dizeres: “Antes
mal acompanhado do que só”. Logo notei que de nada adiantara nossa
discussão, pois ela me beijava e me parabenizava por mais um ano de vida.
— Feliz
Dezesseis!—beijou-me afobada, dando tapas em meu rosto e braços.
Eu ainda estava fora de área, porém, não hesitei em
beijá-la tão recíproca e arduamente.
— Vem aqui, gostosa! —coloquei-a debaixo do meu corpo, em questão de
segundos.
E
sem pensar nas consequências, quebrando toda a promessa que fizera a mim mesmo
na noite anterior, transamos — e novamente discutimos.
— Porra, Johnny... Quando vamos assumir pra valer
nosso compromisso?
Eu sabia o que responder. Entretanto, teria de ser
leve com as palavras, pois não queria magoá-la outra vez.
— Victória... Eu gosto de você, mas não penso em
compromisso sério com ninguém! —respondi meio que ressabiado.
Ela continuou encarando-me com fúria. Logo, bradou:
—Antes mal acompanhado do que só! É exatamente isso
que eu significo pra você, não é mesmo? Esta sua camiseta ridícula faz
sentido... —cuspia as
palavras, esticando com força a camiseta sobre o seu corpo.
Ela gritava feito louca, e mesmo o meu quarto
ficando nos fundos de casa, conseguiu acordar minha mãe com seus berros.
— Johnny... Está tudo bem? —perguntou mamãe, encostada na porta do meu quarto.
E mais uma vez ela me fez perder o fio de
paciência... Eu não entendia porque ela não conseguia falar em tom normal, como
qualquer outra pessoa. A impressão que eu tinha, era que ela fazia aquilo
propositalmente, apenas para me tirar do sério, pois esse era seu dom maior
comigo.
—Tá tudo bem, mãe... Não se preocupe! —fui breve na resposta.
Encarei Vicky com fúria. Ela, por sua vez, entendeu
o recado, ficando em silêncio. Contudo, mesmo com o silêncio momentâneo,
segundos depois, mamãe entrou em meu quarto.
— Oh, Johnny! Faça-me o favor, cubra-se. —Dona Lourdes falou, virando o rosto em direção à
parede.
Segundos depois, saiu do quarto deixando-nos a sós.
Respirei fundo e tentei não ser tão grosseiro com Vicky.
— Agora sou eu quem diz: Porra, Vicky! Eu moro com a
minha mãe, tenha ao menos um pouco de respeito, e quando pensar em ter um
chilique de novo, tente ao menos se conter com os berros... — eu a encarava com fúria.
Aquele era um dia especial —o dia do
meu aniversário. E ele não
começara tão bem, pois, relembrar de mamãe avistando-me nu, tão intimamente,
era assustador.
— Você quer tomar café? —tentei ser educado, convidando-a para o café da
manhã.
Ela abriu um largo sorriso em aprovação,
deixando-me com raiva pelo convite que eu acabara de fazer. Por fim, eu estava
apenas sendo gentil, fazendo um convite superficial, ansiando por um “não” como
resposta.
—Vicky, por favor, sem discussões! Eu já disse que
gosto de você, portanto deixe as coisas fluírem... — alertei-a, tocando seu rosto.
Eu queria acreditar no que acabara de dizer. No
entanto, a única certeza que tinha, era que não queria que nada fluísse ao lado
de Vicky.
— Feliz aniversário, filho! —mamãe me recebeu com um forte abraço de urso e uma
caixa de presente em mãos.
— Mãe, por que gastou dinheiro comigo? —questionei-a, arqueando a sobrancelha esquerda.
Ela, por sua vez, encarou-me sorridente, consentindo
a presença de Vicky em nosso café da manhã. Em seguida, rebateu:
— E quem disse que eu gastei dinheiro algum? Não
tire conclusões precipitadas, João Roberto. —aguardou ansiosa para que eu abrisse o presente.
Foi então que sentei-me na cadeira da cozinha, em
seguida abri o presente... Fiquei emocionado ao me deparar com aquela
maravilhosa surpresa. Ao segurar a jaqueta de couro preta que pertenceu ao meu
pai, emocionei-me. Na verdade, lembrei-me de todas as vezes que eu o vi
tocando-a, como se ela fosse um relicário, viajando para um mundo que era só
dele e que eu desconhecia.
— Não sei se você se lembra, mas esta jaqueta
pertenceu ao seu pai! Ele usou muito na adolescência, especialmente na época em
que nos conhecemos, e até mesmo quando você estava aqui, dentro da minha
barriga. —falou mamãe, com sua mão direita sobre o ventre.
— Que máximo, Johnny! Você vai ficar ainda mais
gostoso nessa jaqueta! —disseVicky, sem ponderar as palavras.
Eu notei o fitar de reprovação de mamãe, assim que
Vicky falou daquela maneira, tirando o encantamento do momento. Ela sequer se
deu conta do que havia acabado de dizer. Aliás, o que mais me desanimava e entristecia em relação à Vicky, era o fato de ela agir
daquela maneira, sem pensar, apenas sendo ela mesma.
— Mãe, este é o mais lindo presente que eu poderia
ganhar! Obrigado! Amo você! —retribui a surpresa com um forte abraço e um beijo carinhoso em sua
testa.
— Ok! Agora vamos ao nosso café da manhã especial. —mamãe apontou a mesa cheia de delícias.
Foi então que percebi o carinho especial que ela
tivera. Ela havia preparado tudo o que eu mais gostava, fazendo-me salivar
sobre a deliciosa e farta mesa. Avistei pães de queijos recém-assados, ao lado
de outros tantos pães recheados (doces e salgados), e também muitas frutas
aparentemente lindas e saudáveis e ao lado de um jarro com o meu suco
predileto, de laranja com cenoura, encontrava-se um pequeno bolo com os
dizeres: “E que venham muitos mais.”
— Acho melhor cantarmos parabéns, pois se eu não
fizer isso agora, decerto não o farei depois... — explicou-me o porquêdo bolo já estar sobre a mesa.
E foi então que me dei conta de que há anos não
comemorava meu aniversário ao lado dela.
— A não ser que a senhora queira que a turma venha
aqui à noite! —disseVicky, sem hesitar.
Meu affairconturbado
acabara de sugerir um furdúncio em meu lar. No entanto, mamãe não a reprovou
com o olhar. Pelo contrário, pois ficou muito feliz com sua sugestão. E mesmo
com o semblante em dúvida, exclamou:
—E por que não? Avise seus amigos para vir comemorar
o seu aniversário, Johnny.... —disse mamãe, com certeza nas palavras.
Eu sabia que aquela era uma péssima ideia, pois
mamãe não aceitaria meia dúzia de marmanjos enchendo a cara, fumando maconha e
falando coisas absurdas. No fundo, ela sabia que eu agia daquela maneira ao
lado dos meus amigos. Contudo, ela sempre tentava me mostrar que aquele não era
o caminho certo a seguir.
— Johnny, quando eu olho pra você, eu vejo o seu
pai... Isso é preocupante, pois não quero que você leve esse estilo de vida
adiante. —lamentou-se,
fitando-me dentro dos olhos.
Vicky, por sua vez, engasgou com um pedaço de pão
de queijo, fazendo-nos voltar toda a atenção para ela. Segundos depois, disse:
— Acho melhor eu ir nessa! Depois ligo pra você,
Johnny. —despediu-se
beijando-me com entusiasmo, como se minha mãe não estivesse por perto.
Eu sabia que escutaria um sermão, e também estava
ciente que minha obrigação era ficar em silêncio e escutar o que mamãe tinha a
dizer...
— Johnny, me entristece ver o rumo que está tomando.
Não sou contra sair e se divertir, mesmo porque, eu também fazia isso na
adolescência. Aliás, quando conheci o seu pai, ele era exatamente como você, e,
muitas vezes, eu o acompanhei. No entanto, depois de algum tempo, aconteceu um
milagre... E este milagre veio para nos salvar. —ela começou a revelar um pouco mais de sua vida.
Eu a encarava atônito, ansiando por mais
revelações. Peguei-me pensando: Será que
eles também já haviam feito tantas loucuras quanto eu?
—
João Roberto Macedo é o nome deste milagre. Amor,
você é a única coisa boa que me restou, e eu sofro em vê-lo levando a vida
desta forma. Eu não consigo pregar os olhos enquanto você não chega em casa, e
cada vez que você aparece com uma quantia considerável em dinheiro, me
entristeço ainda mais, pois sei que esse dinheiro é fruto dos rachas que você
participa. —encarou-me
com os olhos marejados.
Engoli seco minha paúra, e fiquei mais bestificado
ao constatar que mamãe não era tão desprovida de informações quanto eu pensava.
Foi então que certifiquei-me de que, por este motivo, desde que meu pai
falecera, ela pegava no meu pé.
— Sabe, Johnny, você mal vai à escola e isso é um
desperdício, pois é tão inteligente... Sempre gostou de estudar, mas de uns
tempos pra cá, meio que sem querer, alguma coisa aconteceu... Parece que vive
contra o relógio, como se sua vida fosse acabar de uma hora pra outra. Isso me
apavora! —uma lágrima
escorreu por sua face.
Por fim, todo o sermão que eu estava escutando em
silêncio, fazia sentido.
— Seu pai deve estar muito triste de ver o rumo que
você está seguindo, e quando falo isso, digo por experiência. Eu o amarei por
toda minha vida, e fico mais aliviada em saber que foi um câncer que o tirou de
nós, e não as drogas e os rachas. Aliás, se não fosse por você entrar em nossas
vidas, certamente, tanto eu quanto ele, teríamos um final trágico. —ela avisou-me do erro que estava cometendo ao
seguir a vida daquela maneira.
Instantes depois, brotaram mais lágrimas em seus
olhos. Eu sabia o que mamãe pretendia com toda aquela revelação, e sabia também
o quanto ela enxergava do meu pai em mim. Fitei-a, e notei mais lágrimas
escorrendo por sua face.
— Não chore, mãe! Isto acaba comigo. —abracei-a com tamanho carinho.
Por alguns segundos, ela apenas continuou
encarando-me com preocupação e tristeza. Em seguida, continuou a declamar o seu
sermão:
— Filho, o seu pai sempre dizia que eu era um anjo
em sua vida, e mal se deu conta de que ele também fora o meu... Ele sempre
orgulhou-se muito em ter conseguido seguir a vida, como qualquer outra pessoa,
e, mesmo na dificuldade, nos proporcionou uma vida boa, confortável e com muito
amor.
Cada palavra dita, fazia com que meu coração se
apertasse mais... Era como se aquele fosse um momento único e exclusivo. Eu
tive uma desconfortável sensação, como se aquele fosse o meu último aniversário
ao seu lado.
— Johnny... Eu amo você mais do que tudo na vida! E
acredito piamente que um anjo aparecerá em sua vida, e, quando isso acontecer,
serei a mãe mais feliz do mundo. Tenho fé que um dia eu lhe direi: “É isso aí garoto””. Espero que quando isso acontecer, aquela “garota
enxaqueca” esteja bem longe... — gargalhamos em
uníssono.
Garota enxaqueca era uma maneira plausível de
definir Vicky! E só então percebi que minha mãe já sabia que há tempos ela
pernoitava em meu quarto.
— Filho, eu não acho que ela seja uma má pessoa!
Apenas fico preocupada como se comporta. Eu não gosto como aquela garota grita
com você. Aliás, percebo o quão você fica nervoso e desanimado quando isso
acontece, e pelo amor de Deus, não me diga que isto é amor... —aguardou minha sincera resposta.
Arqueei a sobrancelha esquerda, descrente com o que
minha mãe acabara de dizer... Dona
Lourdes me conhecia como ninguém.
— Mãe, por favor, isso nem de longe é amor! Mas não
vou negar que sinto carinho por ela.
Senti seu nervosismo ao querer me perguntar algo,
creio eu, muito particular. Segundos depois, questionou-me:
— Vocês estão se precavendo? Estão usando camisinha?
—sua preocupação era visível.
Enrubesci-me com a pergunta. Eu não era acostumado
a falar sobre essas coisas com mamãe.
— Não se preocupe, Dona Lourdes! Nós estamos nos
cuidando, e tão cedo a senhora não será vovó. —tentei tranquilizar o seu coração.
Eu me senti na obrigação de dar um pouco de paz
para ela, e também senti necessidade em deixá-la satisfeita. Foi quando, fitando
os seus olhos tão azuis quanto os meus, anunciei:
— Guarde o bolo na geladeira, pois à noite teremos
que cantar parabéns!
Ela olhou-me de esguelha, com incredulidade, e com
um sorriso de canto desafiou-me:
— João Roberto, eu faço uma aposta que isso não
acontecerá. —afrontou-me com esperança.
E abraçando-a com carinho, respondi:
— Deixa disto, Dona Lourdes... Não precisa apostar,
pois estou dando a minha palavra! No entanto, terei de comprar mais algumas
cervejas. —alertei-a.
Ela sorriu, satisfeita e feliz. E naquele momento,
resolvi deixá-la ainda mais feliz com outra decisão:
— Aliás, pode ficar tranquila que a partir de
segunda-feira, tentarei comparecer em minhas maçantes manhãs no colégio São Leopoldo. —comuniquei minha nova e torturante decisão.
Ela abriu um largo sorriso, surpresa com a decisão
que eu acabara de tomar. De certa forma, me senti aliviado e feliz por ter
tomado uma decisão que acalmara o seu coração. Eu estava enxergando quão
ausente estava em sua vida, e pensando sobre este ponto de vista, tentaria
mudar algumas coisas.
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